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Hugo de Almeida Pinho — Pedra Pedra

Curador: David Revés

Há que partir a pedra – uma tentativa de retirar-lhe os segredos. Mas ao parti-la, na nossa mão, ficarão duas (mais pedras, novas pedras).

São imagens em resistência. Em resistên-cia à sua conversão em materialidade visual estática e concreta. Essa resistência trazem-na das pedras que apresentam: mas a imagem de uma pedra é já outra coisa.

Situam-se num limbo inquieto, entre a total escuridão e a máxima luminosidade cegante, revelando-se em pequenos bri-lhos que ora desvelam ora bloqueiam, abrindo assim passagens para uma ar-queologia alquímica do seu ser-imagem. Ténues clarões que procuram fixar a sua luz no interior – no seu próprio interior ou no daquele que olha.

Pedra Pedra situa-se, assim, num pen-samento sobre uma qualquer origem da imagem e da relação que, através dela, desenvolvemos com o mundo. De uma primitividade na forma de olhar-olhar aqui enquanto relação (imagem enquanto relação) – até ao aparato hipertecnológico que hoje a serve e possivelmente condi-ciona como estado de abertura potencial ao Outro-mundo e que remete o próprio indivíduo a uma condição de abismo ve-lado, retirando-lhe muitas das suas ca-pacidades de individuação e, justamente, de relação. Um estado de alienação dire-cionada à destruição do seu próprio ser enquanto individualidade a construir-se. (como os insectos atraídos pela luz de um projector que Hugo de Almeida Pinho filma ou na relação metafórica de vertigem causada pelo lento foque-desfoque de pedras captadas numa praia).

Se a história da pedra pode ser a história da própria tecnologia, desde o sílex pale-olítico até ao silício, como purificação da pedra, utilizado nas redes ecrãnicas ou na hipertecnologia de Silicon Valley, o seu movimento, nesta exposição, poderá igualmente ser aposto ao movimento da imagem. (o artista trá-lo nos dispositivos de slides em sistemas rotativos que so-brepõem ordens distintas de imagens como forma de acentuar-lhes ligações es-condidas ou confrontos eminentes).

Servindo-se, ainda assim, dessa mesma tecnologia para a contrariar, Pedra Pedra distorce condições tão exacerbadamente normalizadas do poder alucinante, por exaustão, dos terminais de imagens con-temporâneos –, restituindo à imagem uma certa sacralidade como forma de estabilização individual (as caixas de luz dão-nos esse sinal), e fazendo com que o olhar não só se possa levantar (assim o diria Benjamin), mas também se direcionar para baixo, para o lado, para dentro.

David Revés

créditos © photodocumenta

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